segunda-feira, 5 de março de 2012

SLIDE: INCLUSÃO SOCIAL E EDUCATICA

https://docs.google.com/presentation/d/1b22Ybtbe5qRAE5kp-vym04gNn6xSvdGO-BlvmgbShvE/edit#slide=id.p19

Obs: Slides no link acima.

POLÍTICA DE INCLUSÃO NO BRASIL


I. A POLÍTICA DE INCLUSÃO NO BRASIL

No Brasil, como na maioria dos países pobres têm-se as mais duras condições de discriminação e exclusão comuns ao capitalismo. Por isso, uma análise mais detalhada da história nos fornece importantes reflexões sobre sua condição social e os reais obstáculos para a construção de uma política inclusiva.

Nos primórdios do nosso país, a pessoa com deficiência, oriunda da classe dos trabalhadores ou mesmo dos escravos
4 não tinham chances de receber educação, e sua sobrevivência esteve gravemente comprometida.

4 Os escravos brasileiros não tinham nenhum direito assegurado. O índice de mortalidade entre eles era alto, em razão das péssimas condições de moradia, higiene e educação, o que agravava as epidemias, doenças e deficiências.

Os comerciantes de escravos portugueses vendiam os africanos como se fossem mercadorias aqui no Brasil, mas o interesse era somente para os mais saudáveis que chegavam a valer o dobro daqueles mais fracos, deficientes ou velhos. Portanto, ser escravo e ter deficiência era condição para a morte, pois não interessaria aos compradores adquirir escravos que não pudessem suportar o árduo trabalho que lhe era reservado nas fazendas de açúcar.

Sabendo que a escravidão no Brasil iniciou-se no século XVI e só teve fim no século no final do século XIX, fica evidente que nenhuma ação política foi dispensada para este grupo, caso fosse possuidor de alguma deficiência. Por outro lado, as pessoas mais pobres – mesmo livres - estavam alijadas de qualquer ação educativa, enquanto os nobres contavam com preceptores contratados para garantir a educação de seus filhos, quando estes não eram enviados à Europa para estudar.

De acordo com Mazzotta, a história da educação das pessoas com deficiência no Brasil divide-se em dois momentos distintos: um primeiro, de iniciativas isoladas (oficiais e particulares), e um segundo momento, de iniciativas oficiais de âmbito nacional. Para o autor, pode-se dizer que o primeiro momento é marcado pela inexistência de políticas públicas voltadas para o atendimento destas pessoas, e o segundo caracteriza-se pela definição mais clara de tais políticas (MAZZOTTA, 1996:27-28). 10

1.1. As Políticas Brasileiras para a Pessoa com Deficiência, uma questão de classe social

É somente a partir do final do século XIX e, mais precisamente no século XX que temos registros detalhados das ações políticas brasileiras com respeito à educação. Assim, vê-se que os interesses de classe sempre guiaram os caminhos educativos do nosso país e, no caso da pessoa com deficiência não foi diferente. Não é sem motivos que as primeiras instituições criadas foram: O Imperial Instituto dos Meninos Cegos, 1854 e o Imperial Instituto dos surdos-mudos, em 1857.

De acordo com as pesquisas de Jannuzzi (2004), o Imperial Instituto dos Meninos cegos (hoje, Instituto Benjamin Constant) tem sua origem ligada ao cego brasileiro José Álvares de Azevedo, filho de família abastada que estudara em Paris no Instituto dos Jovens cegos, fundado por Haüy.

Este jovem rico publica um livro que impressiona o médico do imperador, que também possuía uma filha cega. Em meio à sensibilidade de pessoas influentes a respeito do atendimento educacional especializado para cegos, o imperador resolve fundar o instituto. Portanto, a instituição não fora criada para jovens cegos pobres, pois também a indicação dos cegos para estudar no instituto imperial foi feita pelo Imperador.

Não é de se estranhar, portanto, a informação de que em 1874 este instituto tenha atendido somente 35 alunos cegos, quando o registro do recenseamento brasileiro indicasse a existência de pelo menos 15.848 cegos.

Quanto ao Instituto de surdos-mudos (hoje, Instituto Nacional de Educação de Surdos), sua fundação também se pautou na sensibilidade de alguns nobres e o ingresso de alunos também foi indicação do Imperador. Logo após sua fundação, o instituto contava apenas com 7 alunos surdos. E, em 1872 quando este número chegara somente a 17 matrículas, o Brasil possuía de acordo com dados do censo uma população de 11.595 surdos. Onde estariam os demais, se não havia outras instituições de atendimento?

Nesta direção, podemos citar conforme Jannuzzi que a educação das pessoas com deficiência, sobretudo pobres, sempre viveu distante dos interesses políticos do país: "(...) surgiu institucionalmente, mas de maneira tímida, no conjunto das concretizações possíveis das idéias liberais, que 11

tiveram divulgação no Brasil no fim do século XVIII e começo do XIX" (JANNUZZI, 1992, p. 19).

Para a autora, o liberalismo brasileiro esteve claramente comprometido com as elites, concretizando um projeto de educação somente voltado para estes interesses. A educação do povo foi relegada ao esquecimento, assim como a educação para crianças deficientes oriundas do povo.

Também para Ferreira (1995, p. 25), as poucas instituições criadas neste período, se fundavam "na perspectiva do tratamento moral ou medicina moral, na linha do treino psicomotor, com imposição de hábitos regulares e freqüentes, como oposição à anomalia fisiológica". Portanto, a institucionalização da deficiência no caso brasileiro, baseou-se num olhar de descrédito sobre a condição destes sujeitos aprenderem e incluírem-se socialmente, o que foi calamitoso para os mais pobres, pois os mais ricos puderam assumir a responsabilidade sobre a educação de seus filhos pagando aos especialistas.

Nossa situação durante o século XIX foi: uma vasta população de iletrados, poucas escolas e uma elite cultural e econômica responsável pelos destinos do país. Diante disto, o que progrediu no Brasil foi o ensino superior, facilitado pelo apoio do governo e interessante às camadas com as rendas mais altas da população.

Salienta-se, ainda neste contexto, a predominância do atendimento médico em detrimento do pedagógico, exatamente como acontecia em outras partes do mundo. Seguindo esse olhar médico em relação às pessoas com deficiência temos em 1874, o início do atendimento aos chamados "deficientes mentais" no Hospital Estadual de Salvador (hoje, Hospital Juliano Moreira).

Após a fundação dos institutos imperiais para surdos e cegos, somente há registro de ação voltada para esta demanda trinta anos mais tarde, com a realização do I Congresso de Instrução Pública, que abordou dentre outros temas o currículo e formação de professores para cegos e surdos5.

5 Sobre o congresso de Instrução Pública, realizado em 1883, ver Mazzotta, Educação Especial no Brasil: História e Políticas Públicas, 1996.

Outras iniciativas serão vistas somente no século XX. Destacam-se a fundação do Instituto de cegos de Recife, em 1906 e os trabalhos publicados 12

no início do século XX por importantes nomes da história de atendimento aos indivíduos com deficiência no Brasil.

Os principais são: Da educação e tratamento médico - pedagógico dos Idiotas, por Carlos Eira; A educação da Infância Anormal no Brasil, por Clementino Quaglio; Tratamento e Educação das crianças anormais e A Educação das crianças mentalmente atrasadas na América Latina, por Basílio de Magalhães; Infância Retardatária, por Norberto de Souza Pinto.

Como se pode constatar, o Brasil demonstra nestas obras a mesma tendência medicalizante ao discutir a questão da deficiência. Um dos mais conceituados médicos brasileiros que atuaram na área das deficiências foi Ulisses Pernambucano. É considerado por muitos como importante referência na questão das doenças mentais, tendo fundado o sanatório Recife.

Por sua história e toda sua obra foi a principal referência nos estudos de psicologia no Brasil, tendo fundado nas terras pernambucanas, o Instituto de psicologia, em 1925. Sua atuação voltou–se essencialmente para os excluídos e marginalizados de seu tempo, com destaque para as crianças com problemas mentais. Exemplo disso é sua monografia para o concurso de professor catedrático da Escola Normal, onde Ulisses discutia sobre a classificação de crianças deficientes (Disponível em http://www.psiquiatriainfantil.com.br).

Por outro lado, o Brasil também foi um dos primeiros países a ter um movimento eugênico organizado. Ainda nos primeiros anos da década de 20, o médico Renato Kehl lança uma campanha pró-eugenia. O movimento eugênico no Brasil foi bastante heterogêneo, trabalhando com a saúde pública e com a saúde psiquiátrica. Uma parte, que pode ser chamada de ingênua ou menos radical do movimento eugenista no nosso país, se dedicou a áreas como saneamento e higiene.

Nesta época foi fundado o sanatório Pinel de Pirituba, um local usado como depósito de pessoas que não eram aceitas pelos padrões eugenistas. Assim, o eugenismo propôs ainda meios de transformação da sociedade por adoção de estratégias mais ou menos drásticas.

De início, o exame pré-nupcial, a castração, a esterilização e a educação higiênica seriam as normas básicas para melhorar a cara do nosso povo, considerado doente, pobre e inculto. Mas, as idéias eugenistas 13

chegariam a atitudes mais radicais
6 como: a pena de morte, controle na entrada de imigrantes, proibição do casamento inter-racial e o confinamento das pessoas com doenças contagiosas ou anomalias, em outras partes do mundo. Como se sabe, o eugenismo ganhou força em muitos países, mas em nenhum deles com tamanho desempenho como na Alemanha, onde o nazismo foi sua maior expressão (ZIMBARG, 2007).

6 As leis eugênicas foram amplamente adotadas pelos nazistas. E estas, por sua vez, decorrências diretas de estudos feitos pelo instituto de antropologia, genética humana e eugenia e pela sociedade alemã de pesquisas. Utilizando argumentos médicos do Professor Doutor Eugen Fischer, chefe do departamento de psiquiatria, do psiquiatra Professor doutor Ernest Rudin, chefe do departamento de antropologia e do professor Von Verschuen, essas instituições eram consagradas em suas áreas e foram elas as responsáveis pela orientação e organização da política de esterilização, eutanásia e de extermínio praticadas durante o regime nazista (ZIMBARG, 2007).

Em alguns momentos foi a psicologização; noutros, a higienização - e até a eugenização - , os movimentos que mais influenciaram as instituições brasileiras, voltadas para o atendimento de pessoas com deficiência. O movimento higienista, de acordo com seus seguidores, ocupava-se principalmente em garantir melhores condições sociais e individuais para o país. Já o eugenismo, segundo eles, tinha como propósito, a constante melhoria da raça humana.

Estas ações levaram a fundação da Liga de higiene mental que atuou não apenas nos hospitais, clínicas, asilos, mas também nos muitos estabelecimentos de ensino existentes; especialmente àqueles onde existiam pessoas com problemas mentais.

Até l950 há registros que foram criados 54 estabelecimentos de ensino regular e 11 instituições que prestavam algum tipo de atendimento as pessoas com deficiência. Estas instituições se dividiam em públicas e privadas (de caráter filantrópico), sendo essas últimas as de maior número. Dentre as de maior destaque, citamos: o Colégio dos Santos Anjos, em Santa Catarina; a Sociedade Pestalozzi, no Rio de Janeiro; o Instituto Pestalozzi, na Bahia e a Escola Estadual Ulisses Pernambucano, em Pernambuco, dentre outros.

Aqui, como em outras partes do mundo, a utilização dos testes de QI foi constante, motivados especialmente pela educadora Helena Antipoff. Suas idéias como as de seus antecessores também definem a diferenciação no atendimento da pessoa com deficiência; mas ela acrescenta a importância do diagnóstico, influenciada principalmente pelos conhecimentos da psicologia. 14

Sua defesa, no entanto, é pela organização de classes especiais em escolas públicas, especificamente distribuídas em função do problema apresentado pela criança.

A educação das crianças débeis e anormais não pode ter êxito senão depois de estabelecido o respectivo diagnóstico. (...) E só depois de uma observação atenta e metódica da conduta dessa criança, de acordo com os exames do médico e do psicólogo, depois de profunda reflexão acerca de todos esses lados, das observações e dos exames, é que o professor terá conhecido e compreendido os seus alunos e resolvido o complexo problema da personalidade (apud JANNUZZI, 2004, p. 125).

Assim, desde os seus primórdios, permanece na educação brasileira um conflito básico entre ensino especializado X ensino comum. E ao que parece, no ensino comum, de responsabilidade do Estado, pouco ou nada se desenvolveu em benefício da escolarização destes indivíduos. As ações são mínimas em todo o território nacional. Por outro lado, isto deu margem para que desenvolvesse um ensino especializado, geralmente de responsabilidade de instituições particulares ou filantrópicas (mas, mantidas também com recursos do governo).

É, pois, somente nos anos finais da década de 50 que surgem as primeiras ações mais organizadas por parte do governo federal, as chamadas campanhas de reabilitação e educação para surdos, cegos e pessoas com deficiência intelectual. Pouco se sabe dos resultados destas campanhas para os alunos com deficiência, mas, certamente, num país onde 50% das crianças na faixa etária de 7 aos 14 anos ainda estavam fora da escola, não era de se estranhar que crianças com deficiência não tivessem oportunidades.

À medida que ampliou-se o número de escolas, aumentou com elas o número de classes para alunos com deficiência. No entanto, as crianças de alto poder aquisitivo não participaram destas classes, pois contavam com os serviços de apoio especializado, seja de terapeutas, psicólogos, médicos, etc., pagos pelas famílias, de modo que pudessem, com estes recursos, permanecer em classes regulares.

De acordo com Jannuzzi:

Geralmente as chamadas classes especiais têm sido ocupadas pelas crianças de camadas mais desfavorecidas, atestando assim, muito mais a diferença cultural ou até muitas vezes 15

dificuldades provenientes da própria ineficiência da escola (JANNUZZI, 1989, p. 21).

Os interesses de classe sempre acompanharam a educação brasileira. Nos textos oficiais fica claro a vinculação da educação aos interesses econômicos e de mercado. E as pessoas com deficiência, vistas certamente, como as menos capazes neste processo, embora não fugissem a estes reclames, não eram prioridade. Mas, para as pessoas com deficiência, de famílias com alto poder econômico, estas questões eram resolvidas a partir do financiamento da própria educação. No entanto, o mesmo não pode ser dito para os trabalhadores.

Enquanto não se puder abrir largamente as portas da educação a cada um, o interesse nacional recomenda que se favoreça a ascensão cultural dos mais talentosos, os mais capazes de mobilizar a ciência e a técnica em favor do progresso social. O único bem que nação alguma está em condições de desperdiçar é o talento de seus filhos. (...) Mas o mesmo interesse social exige que se eduquem os deficientes, no sentido de torná-los, quanto possível, participantes de atividades produtivas. (apud JANNUZZI, 2004, p. 179). (grifo nosso).

O segundo momento da Educação Especial no Brasil tem como marco inicial o ano de 1957. Em termos gerais, é interessante ressaltar que o momento brasileiro era de inúmeras transformações nos processos econômicos e nas relações de poder, e que o Estado passava a assumir, seletivamente, a reprodução da força de trabalho e da educação escolar como incremento do modelo vigente.

Em relação às pessoas com deficiência, os momentos que denunciam as ações diretas do Estado, se iniciam com a promoção de várias Campanhas de Educação e Reabilitação, em nível nacional. Ressaltamos aqui, a Campanha para a Educação do surdo brasileiro (1957); a Campanha Nacional de Educação e Reabilitação de Deficientes da visão (1958); Campanha Nacional de Educação e Reabilitação de Deficientes mentais – a Cademe (1960).

Tais campanhas tiveram suas motivações em movimentos e documentos internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e o próprio movimento em defesa dos direitos sociais que se 16

estendia fecundamente pelo mundo. Este cenário leva profissionais, além de seus pais e amigos, a se organizarem em associações brasileiras representativas destas pessoas. Surgem, então, em todo o país, as Apaes
7, evidenciando um movimento de fortalecimento da sociedade civil, mas ainda pautado no caráter filantrópico e não de direitos.

7 APAE – Associação de pais e amigos dos excepcionais são instituições filantrópicas difundidas em todo o Brasil a partir de 1954.

8 O processo de Integração no Brasil procurou inserir as pessoas portadoras de deficiência nos sistemas sociais gerais como a educação, o trabalho, a família e o lazer.

9 Mainstream consiste numa tentativa de integração dos alunos portadores de deficiência em classes regulares, em momentos específicos.

10 Sobre as repercussões do Golpe de 64 na Política Educacional brasileira ver: Romanelli, 2000.

O surgimento das Apaes tem influência direta das primeiras organizações internacionais de pais, especialmente dos Estados Unidos, a exemplo da NARC. Começam a despontar, desde então, os fundamentos de uma política de integração8, tendo como princípios a normalização e o mainstream9.

Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n.º 4.024/6l, os princípios da integração permanecem praticamente inalterados e o pouco envolvimento do Estado com as pessoas com deficiência também. Esta Lei determinou que "a educação de excepcionais, deve, no que for possível, enquadrar-se no sistema geral de ensino, a fim de integrá-los na sociedade". No entanto, suas idéias não conseguiram sair do papel.

De forma ainda embrionária, em 1961, com a criação da Associação Brasileira dos Deficientes físicos – Abradef surge o primeiro movimento dirigido pelos próprios indivíduos com deficiência, pois até então, predominavam as associações organizadas e dirigias por pessoas sem deficiência, amigos e voluntários que se voltavam à filantropia.

Com o Golpe de 1964
10, muitos movimentos foram desarticulados e na esfera oficial as alterações são intensas, tanto do ponto de vista estrutural, como de valores e concepções. Há um fortalecimento do Estado em detrimento da sociedade civil, predominando as forças ditatoriais e a coerção.

A prioridade do Estado brasileiro expressa nos seus Planos de Desenvolvimento de 1964 a 1975 é o crescimento econômico em detrimento 17

das condições sociais da população. Neste contexto, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n.º 5.692 nada mais é senão um reflexo da nova política. Nela, as diretrizes de atendimento aos indivíduos com deficiência remetem à integração e a racionalização dos serviços, ou seja, o máximo de economia.

Nesta fase, crescem as classes especiais dentro das escolas regulares, como forma de atendimento público, revelando que a ampliação deste tipo de atendimento teve muito mais de motivação econômica que pedagógica. Por outro lado, no âmbito particular, prevalecem as instituições especializadas para o atendimento desta clientela.

Como parte das novas políticas educacionais é criado em 1973, o Cenesp (Centro Nacional de Educação Especial) com a finalidade de "promover, em todo o território nacional a expansão e melhoria do atendimento aos excepcionais" (expressão utilizada na década de 70 para as pessoas com deficiência) (MAZZOTTA, 1996:55).

Influenciado, em grande parte pelos movimentos internacionais, que culminaram com a assinatura da
Declaração dos Direitos das Pessoas portadoras de deficiência é organizado em São Paulo, em l977, o I Congresso Paulista sobre a Problemática da Cegueira. Ainda este ano, o Cenesp elabora o Plano Nacional de Educação Especial (1977-1979), com o objetivo de assegurar aos excepcionais o direito a um atendimento educacional que responda às suas necessidades especiais, condição básica e indispensável para sua realização pessoal e integração social, ou seja, o ideário da integração continua povoando as ações públicas brasileiras.

No novo contexto político brasileiro, denominado de Nova República, o Cenesp é transformado em Secretaria de Educação Especial – Seesp e conta com o apoio de um novo órgão: a Corde (Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência11), responsável pela formulação do primeiro Plano de Ação para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, desenvolvido no período de 1986 a 1989.

11 A partir dos anos 80, a terminologia adotada para referir-se à pessoa com deficiência é Pessoa Portadora de Deficiência.

Do lado da sociedade civil, observa-se uma crescente articulação entre as entidades para pessoas com deficiência e as organizações de pessoas com 18

deficiência. O surgimento das federações de cegos, surdos e pessoas com deficiência física e mental se constituiu num importante mecanismo de participação do povo na definição de políticas públicas no Brasil.

Desde 1988, com a nova Constituição Federal Brasileira, fica estabelecido no seu Art. 208, parágrafo III, que é dever do Estado garantir "o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino". Há ainda outros artigos e incisos referentes às pessoas com deficiência na área da saúde, trabalho, assistência social, ampliando os alcances da política pública para este grupo.

A década de 90, tão próxima do novo milênio, ainda testemunhou a condição de exclusão deste grupo, declarando a necessidade de que algumas ações políticas fossem assumidas pelos governos dos diversos países em prol dos mais pobres. A Conferência Mundial de Educação para todos (1990) foi um dos mais expressivos eventos neste sentido, onde se reconhece a urgência em se promover políticas públicas que promovam educação de qualidade a todas as pessoas, independente de suas condições sociais ou econômicas.

Para nós, o mais importante nestas declarações é o reconhecimento que a situação econômica interfere diretamente na possibilidade ou não de inclusão social, mesmo para as pessoas com deficiência. E que se não atentamos para estes aspectos não possibilitamos nenhuma oportunidade efetiva de inclusão para estes sujeitos.

Quanto a isto, salienta-se ainda que, embora reconhecendo todas as contribuições que a ciência trouxe para a pessoa com deficiência, nenhuma delas se efetiva, se o sujeito não tem meios financeiros para isso. Portanto, é urgente que o Estado, ao formular sua política de inclusão, contemple aspectos econômicos na definição de suas metas, para que não continue promovendo a inclusão de alguns e a exclusão de milhares.

Outras leis brasileiras coadunam com esta tendência: a Lei Federal n° 7.853, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a própria LDB 9.394. A partir da nova LDB, a Educação Especial perpassa transversalmente todos os níveis de ensino, desde a educação infantil até o ensino superior, e é considerada, ainda, como um conjunto de recursos educacionais e estratégias de apoio que estejam à disposição de todos os alunos, oferecendo diferentes alternativas de atendimento (SANTIAGO, 2003). 19

Neste contexto e influenciados pela Década da Reabilitação, instituída internacionalmente a partir de 1983, grupos de pessoas de todo o Brasil mobilizaram-se junto aos indivíduos com deficiência, organizando o AIDP –
Ano Internacional do Portador de Deficiência. Este acontecimento motivou diversos encontros na área, especialmente reunindo entidades formadas pelos próprios sujeitos e seus familiares. Dessa forma, eles começam a assumir a direção de seus movimentos, reelaborando suas práticas e questionando as atitudes paternalistas e assistencialistas da sociedade.

Paralelo a isto, a comunidade acadêmica, além de algumas instituições sociais e as próprias organizações de pessoas com deficiência reivindicam políticas públicas mais eficazes no sentido de garantir a participação social destes indivíduos nos diversos espaços da vida social.

A expressão integração é paulatinamente substituída pelo conceito de inclusão, compreendida enquanto a inserção total e incondicional de todas as pessoas aos bens sociais.

Na perspectiva da inclusão:

As escolas precisam ser reestruturadas para acolherem todo espectro da diversidade humana representado pelo alunado em potencial, ou seja, pessoas com deficiências físicas, mentais, sensoriais ou múltiplas e com qualquer grau de severidade dessas deficiências, pessoas sem deficiências e pessoas com outras características atípicas, etc. É o sistema educacional adaptando-se às necessidades de seus alunos (escolas inclusivas), mais do que os alunos adaptando-se ao sistema educacional (escolas integradas) (SASSAKI, 1997, p. 9).

Nessa direção, R. Edler Carvalho (2000) como estudiosa da proposta inclusiva, assinala que para viabilizar as estratégias transformadoras e concretizar as ações que o contexto de cada instituição educacional brasileira exige, é preciso em primeiro lugar, vontade política dos dirigentes, além de recursos econômicos e competência dos sistemas de ensino. Portanto, a conquista destas condições no caso brasileiro pressupõe a elaboração de um projeto coletivo que integre toda a sociedade em prol da transformação da escola pública numa escola para todos, ou seja, uma política de fato, inclusiva.

Com esta preocupação, o Conselho Nacional de Educação (CNE), em 2001, a partir do Parecer nº. 17 estabelecem que os sistemas de ensino 20

conheçam a demanda real de alunos com deficiência, mediante a criação de sistemas de informação que possibilitem a identificação, análise, divulgação e intercâmbio de experiências inclusivas.

Por outro lado, reconhece-se que não basta identificar onde estão os sujeitos com deficiência, é preciso induzir as escolas a matricular estes alunos, e, inclusive, refletir sobre o que os deixou de fora da escola por algum tempo.

Neste sentido, a resolução do CNE/SEESP n.º 02 declara que:

Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos cabendo as escolas se organizarem para o atendimento aos educandos com necessidades especiais, assegurando às condições necessárias para uma educação de qualidade para todos (BRASIL, 2004).

O Decreto n.º 5.296, de 2006, na mesma direção vem estabelecer normas gerais e critérios básicos para promoção de acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Para tanto, as escolas precisam ser adaptadas sob o ponto de vista arquitetônico, de modo que possam receber os alunos que possuem problemas físicos, motores ou de visão. Mas, estes não são os únicos limites que as escolas brasileiras enfrentam: falta de recursos pedagógicos e despreparo dos professores e demais profissionais talvez sejam os piores.

Algumas medidas, nesse sentido, vêm sendo implementadas, através de programas e projetos, como os desenvolvidos pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) em parceria com o Ministério Público Federal.

Alguns programas de educação presencial e à distância vem sendo desenvolvidos pelas Secretarias de Educação Especial, em conjunto com a Secretaria de Educação à Distância, no sentido de habilitar professores e gestores das escolas públicas, de todo o país, para o atendimento educacional especializado de alunos com deficiência no ensino regular, ou seja, objetivam, pouco a pouco, consolidar a política de inclusão no Brasil.

Nesse processo de mudança, a Resolução 02/2001 que dispõe sobre as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica; o Plano Nacional de Educação (2001), que destaca seu compromisso com a construção de uma escola inclusiva que garanta o atendimento à diversidade humana; o Decreto n.º 3.956, que defende os direitos das pessoas com deficiência e promove a eliminação de barreiras que impedem o acesso à 21

escolarização são algumas das medidas legais adotadas para a inclusão social e educacional.

Além destes, a Resolução CNE/CP n.º 1/2002, que estabelece as Diretrizes nacionais para a formação de professores voltada para atenção à diversidade, contemplando, inclusive, conhecimentos específicos sobre as deficiências; ou ainda a lei 10.436/02, que reconhece a língua brasileira de sinais como meio legal de comunicação e expressão de pessoas surdas, garantindo que sejam implementadas formas institucionalizadas de apoiar seu uso e difusão na escola ou o Decreto 5.626, de 2005 que institui a disciplina de libras como componente curricular das escolas são outras ações que do ponto de vista institucional viabilizam a construção de uma educação inclusiva.

Programas como Educação Inclusiva: direito à diversidade, implementado em 2003 pelo MEC; Brasil Acessível, desenvolvido pelo Ministério das Cidades, em 2004; além da implantação dos Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação (NAAH/S) desde 2005, em todos os estados e Distrito Federal, são evidências que há, do ponto de vista legal, mas, também filosófico e político, um compromisso com a inclusão de alunos com deficiência na rede regular de ensino.

Coadunam com esta premissa, a implementação do PDE Escola (Plano de Desenvolvimento) e a instituição do Decreto n. 6.094, de 2007 que estabelece nas diretrizes do Compromisso Todos pela Educação buscar o fortalecimento do atendimento regular de alunos com deficiência em todas as escolas do Brasil.

Os dados de matrícula de pessoas com deficiência, na rede pública brasileira, expressam, de fato, uma mudança quantitativa nos alunos que ingressaram na escola, mas, ainda, denunciam uma discrepância absurda entre os alunos que estão em classes regulares e os que ainda são atendidos por serviços ou classes especiais, bem como o grande número ainda de alunos atendidos pela rede privada.

Em 1998, registra-se 179.364 alunos com deficiência atendidos pela rede pública de ensino, contra 157.962 alunos atendidos nas escolas particulares, principalmente filantrópicas. Estes números crescem em 2006 na rede pública, mas quase 40% do percentual total de alunos com deficiência permanecem atendidos pela filantropia. 22

Gráfico 1: Distribuição da matrícula de alunos com deficiência

Fonte: Revista Inclusão, 2008, p. 13

O quantitativo de alunos atendidos pelo ensino regular que em 1998 (rede pública e privada) era de 43.923 alcança a margem dos 325.316 em 2006. Ainda assim, fica bem abaixo dos números de alunos atendidos pela educação especial (classes ou escolas), que era 337.326 alunos matriculados, em 1998, e atinge a casa de 700.624 (escolas públicas e privadas) em 2006.

De maneira geral, salientamos, então que, em termos propositivos, a política de inclusão brasileira não deixa lacunas significativas; sua legislação e programas sugerem uma efetiva promoção de respeito às diferenças e valorização da diversidade humana como estímulo para as aprendizagens e não como obstáculo. Entretanto, na prática as proposições políticas parecem não conseguir efetividade, sobretudo, quando analisamos os dados do censo escolar. 23

Gráfico 2: Matrícula de alunos com deficiência na rede pública e privada

Fonte: Revista Inclusão, 2008, p. 13.

Diante disto, nos perguntamos: o que ocorre de fato no conjunto destas políticas que inviabilizam sua consecução? Que ações são necessárias para que possamos garantir que os discursos se realizem no cotidiano das escolas brasileiras? Que elementos ainda faltam para que o Brasil consolide uma política de educação inclusiva e que pessoas com deficiência oriundas das classes populares tenham a mesma chance de inclusão social? Como a educação pode ser um instrumento nesta direção?

REFERÊNCIAS

CARVALHO, Rosita E. Uma promessa de futuro: aprendizagem para todos e por toda a vida. Porto Alegre, 2000.

DEFICIENCIA MENTAL. Disponível em http://www.psiquiatriainfantil.com.br. Acesso em 23 de setembro de 2009.

JANNUZZI, Gilberta S. de M. A educação do deficiente no Brasil: dos primórdios ao início do século XXI. Campinas: SP, Autores Associados, 2004.

_______________________. A luta pela educação do deficiente mental no Brasil. Campinas: SP, IEd. Autores Associados, 1992.

_______________________. Por uma lei de Diretrizes e bases que propicie a educação escolar aos intitulados deficientes mentais. In: Caderno CEDES. Educação Especial, n. 23, p. 5-22, 1989.

MAZZOTTA, Marcos J. Da S. Educação Especial no Brasil: história e políticas públicas.São Paulo: Cortez, 1996.

ROMANELLI, Otaíza de O. História da educação no Brasil (1930-.1973). Petrópolis: Vozes, 2000.

SANTIAGO, Sandra A. S. Educação para todos: um estudo sobre a política de inclusão dos portadores de necessidades educacionais especiais no Brasil. Dissertação de mestrado. Recife, UFPE, 2003.

SASSAKI, Romeu K. Inclusão: Construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro:WVA, 1997.

ZIMBARG,Adriana. A história da eugenia e os crimes do preto Amaral: eugenismo e eugenia no Brasil. Disponível em: http://www.duplipensar.net. Acesso em 20\02\ 2007